A farsa do Holodomor e um genocídio de verdade

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A farsa do Holodomor e um genocídio de verdade
DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER - Foto: Reprodução

Com a dissolução da União Soviética, em 1991, a Ucrânia ganhou sua independência. O futuro do segundo país da Europa em área territorial parecia promissor. No entanto, o sonho se transformou em pesadelo. Entre 2005 e os dias atuais, a economia caiu vertiginosamente e representa 20% do produto interno bruto da época soviética. Hoje, apenas a Moldova é mais pobre. Como se não bastasse, duas províncias se mobilizaram para resistir contra uma tentativa de limpeza étnica defendida por grupos neonazistas, que defendem a eliminação dos não-ucranianos. Em busca de melhores condições de vida, 7 milhões imigraram, principalmente para a Rússia. Qual a razão deste declínio?

Para o presidente ucraniano Volodimir Zelensky, os culpados são os russos. Ele defende a tese esdrúxula de que foram eles que condenaram seu país ao eterno atraso. A culpa não é de agora, viria dos anos de 1932 e 1933, quando, segundo ele, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) condenou milhões de ucranianos à morte por inanição, um holocausto comunista que os historiadores ligados à extrema direita batizaram de Holodomor, palavra que pode ser traduzida como “grande fome”.

Cabe aqui um parêntese: não há provas de que tenha ocorrido um genocídio na Ucrânia, como veremos adiante. Para divulgar esta ideia, que não tem embasamento científico, ele não poupa esforços: realiza campanhas publicitárias para convencer o povo, mobiliza o corpo diplomático para convencer influenciadores estrangeiros e levanta o tópico em todas as ocasiões, inclusive em momentos inadequados, como mensagens de ano novo.

Claro, há um bocado de non sense nesta explicação. Para começar, Joseph Stálin, um georgiano, governava a URSS nos anos que a grande fome, causada por uma seca, atingiu várias repúblicas soviéticas. Ou seja, não era um russo que comandava o país e o fenômeno da fome endêmica atingiu outras regiões do país. Há mais um fator ignorado por Zelensky: houve um pesado investimento nos tempos do socialismo para desenvolver a região que se transformou em um dos maiores polos industriais mundiais.

A farsa do Holodomor e um genocídio de verdade
Estimativas apontam que mais de 3 milhões de ucranianos morreram de fome entre 1932-1933. Foto: Museu Holodomor

Interferência externa

Na verdade, o fracasso da Ucrânia como nação está ligado à interferência europeia e norte-americana nos assuntos internos da nação. A Organização do Tratado do Atlântico Norte, aliança formado pelos países ocidentais, aplica, desde o governo de Bill Clinton, uma estratégia de sufocar a Rússia por meio da absorção de países que faziam parte da União Soviética. Atrair Kyiv para o bloco teria o mesmo de apontar uma faca contra o pescoço de Moscou. Para isto, vale tudo: de 2005 para cá, o país passou por duas revoluções promovidas e financiadas pelo Ocidente. Os movimentos desarticularam o tecido político e abriram brechas para a corrupção desenfreada, fato explorado pelas instituições da União Europeia para negar uma maior cooperação econômica com a Ucrânia.

Durante as administrações dos presidentes Leonid Kravchuk e Leonid Kuchma, o país seguiu uma orientação progressista, voltada para a busca de parcerias para o desenvolvimento tecnológico e industrial. Em 2004, o candidato do governo, Victor Yanucovych — que tinha uma plataforma neutra e propunha a cooperação com a Rússia e a União Europeia — foi eleito. Viktor Yushchenko, o oposicionista mais votado, contestou o resultado e acusou o rival de fraude. Com forte financiamento norte-americano e europeu, ele mobilizou a população para reverter o resultado no que se convencionou chamar de Revolução Laranja.

De uma hora para outra, apareceu desfigurado. Médicos providenciados pela União Europeia diagnosticaram um possível envenenamento por dioxina, um dos elementos usados no agente laranja, empregado amplamente pelos norte-americanos no Vietnã e causa de mutações genéticas e um alto índice de mortes por câncer na nação asiática. Sob pressão, a Suprema Corte da Ucrânia determinou a realização de novas eleições, realizadas em 2005. Yushchenko venceu e, misteriosamente, se recuperou sem sequelas do terrível envenenamento logo depois de tomar posse como presidente.

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Grande Fome na Ucrânia. CRÉDITO: DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER

Passado idealizado

A partir daí, ele iniciou uma política de romantização do passado promovendo a recuperação da imagem do controverso líder nacionalista ucraniano Stepan Bandera (leia mais aqui), que apoiou Hitler nas invasões da Polônia e da União Soviética durante a Segunda Guerra Mundial e que foi acusado, pelos governos polonês e soviético, do crime de genocídio de mais de 200 mil pessoas nos julgamentos do Tribunal de Nuremberg em 1946. Conseguiu se salvar graças aos Estados Unidos e Reino Unido, que viam nele uma ferramenta útil de propaganda para atacar o Bloco Soviético no início da Guerra Fria que colocou em confronto os mundos socialista e capitalista.

Bandera comandou uma rede de espiões (completamente infiltrada por agentes soviéticos) a partir da República Federal da Alemanha e trabalhou pesadamente para espalhar a ideia do genocídio soviético contra os ucranianos pelos países ocidentais. Foi ele quem difundiu o termo Holodomor até ser executado por um agente da KGB (ele foi condenado in absentia por tribunais soviético e polonês) na cidade de Munique, em 1958.

Um dos primeiros atos de Yushchenko, em um aceno aos partidos e milícias de direita, foi reabilitar Bandera, transformando-o no maior herói ucraniano, e transladar seu corpo com honras de chefe de Estado para a cidade de Lvov, onde seus militantes mataram 4 mil judeus na Segunda Guerra Mundial (foto em destaque). A decisão foi contestada de maneira agressiva pela comunidade judaica, mas os protestos não foram ouvidos pelo Legislativo.

A passagem de Victor Yushchenko foi marcada pela corrupção, violação dos direitos humanos e pela prisão de líderes políticos de oposição.

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CRÉDITO: DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER

Cresce o neonazismo

Com a reabilitação de Bandera, o neonazismo envergonhado que subsistia na Galícia, mesmo em tempos soviéticos, veio à luz e floresceu. Milícias antirrussas surgiram que nem cogumelos depois das chuvas e proclamaram publicamente a necessidade de uma limpeza étnica. Estes sentimentos explodiram na segunda revolta promovida e financiada pelo ocidente, batizada de Euromaidan. A vítima foi novamente Victor Yanucovych que derrotou Julia Timoshenko na sucessão de Viktor Yushchenko.

Ele procurou se aproximar da União Europeia para combater a crise econômica extrema vivida pela Ucrânia. Seus pedidos de linhas de crédito e de investimentos para modernizar a base industrial do país foram malsucedidos. Sem apoio econômico, não havia como sair do buraco. O déficit atingia US$ 46 bilhões. O país ainda enfrentava outro problema. A Rússia se mostrava cada vez mais irritada com o roubo de gás destinado à Europa que passava pelo território ucraniano. Neste momento, o presidente russo Vladimir Putin fez um aceno importante: a proposta de um empréstimo de US$ 15 bilhões e uma redução no preço do gás exportado para a Ucrânia.

Era uma boia de salvação e Yanukovych agarrou-se a ela. Ao aceitar a ajuda de Moscou, a União Europeia se afastou, o que irritou boa parte da opinião pública ucraniana, principalmente as milícias neonazistas. O resto é história, financiada pelo Ocidente, a oposição, com apoio armado dos neonazistas, derrubou o governo. O presidente teve de fugir para não ser morto e um empresário, Petro Poroshenko, assumiu. A corrupção atingiu novos níveis e regiões de maioria russa em Donbass resistiram à tentativa de limpeza étnica enquanto a Crimeia retornou ao seio da Rússia.

Zelensky, um ator cômico da TV Ucraniana, foi eleito com uma plataforma anticorrupção, desenvolvimentista e de pacificação. Nada conseguiu e agora procura um bode expiatório para esconder seu fracasso, mas de onde veio a ideia de interpretar o Holodomor como genocídio? A resposta é bem conhecida. Como muitas outras ideias do atual governo ucraniano, de Washington.

Em 1984, no auge da Guerra Fria, o Congresso dos Estados Unidos criou uma comissão, chefiada por James Mace, que apresentou um classificando a fome de 1932-1933 como genocídio da Ucrânia. Os dados usados eram completamente fantasiosos e visavam fornecer uma arma para o presidente Ronald Reagan pressionar a mídia contra o governo soviético. O historiador Stanislav Kulchitsky, principal defensor da tese do Holodomor, admitiu que a decisão do Congresso de definir a fome na Ucrânia como genocídio “não se baseou em documentos, mas nos julgamentos subjetivos das testemunhas do Holodomor.”

Cabe aí uma pergunta: como o mito do Holodomor surgiu? A resposta é simples, a partir de uma mescla de sensacionalismo da imprensa, propaganda política e manipulação da opinião pública em função da Guerra Fria.

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CRÉDITO: DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER

Jornalismo marrom

Em 1934, o New York Journal, controlado pelo bilionário William Randolph Hearst, publicou um artigo de R. H. Sanger intitulado “Ukraine famine toll reaches 3 millions in 8 months” (Fome na Ucrânia atinge 3 milhões em oito meses). O texto se referia aos efeitos de uma pretensa ordem direta do líder supremo da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), Joseph Stálin, determinando a apreensão de alimentos da população ucraniana, como uma forma de punir os arroubos nacionalistas e antirrevolucionários. O repórter alegava ter entrevistado famílias de imigrantes recém-chegados ao porto da cidade atingidos pela tragédia durante os anos de 1932 e 1933. Nunca revelou como conseguiu chegar ao total de três milhões de mortos. No texto, não apresentava nenhuma prova fotográfica.

William Randolph Hearst pode ser classificado como o criador do primeiro império de comunicação de massa. Sua rede de jornais cobria todo o país e distribuía conteúdo para outros meios que assinavam seus serviços. Ele não tinha escrúpulos para impulsionar a venda de suas publicações e lançava mão de conteúdos sensacionalistas para atingir tiragens expressivas, que chegavam a 1 milhão de exemplares. A falta de compromisso com a verdade e a vida extravagante de Hearst inspiraram Orson Welles, o gênio do cinema, a criar uma obra prima: Cidadão Kane (leia mais aqui).

Seu objetivo na década de 1930 era impedir que a União Soviética conseguisse entrar na Liga das Nações, a tentativa malsucedida, formada depois da Primeira Guerra Mundial, de se criar uma instância superior aos países para mediar conflitos e se estabelecer a paz global.

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CRÉDITO: DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER

Sensacionalismo e mentira

Hearst continuou sua campanha e publicou, em 1935, o que seriam as primeiras imagens sobre a tragédia no artigo “Six millions perish in soviet famine” (Seis milhões perecem em fome soviética), em dois de seus diários, o Chicago American e o New York Evening Journal. Em 1987, o jornalista e fotógrafo Douglas Tottle teve oportunidade de examinar as imagens e o texto da reportagem. Em sua investigação, descobriu uma matéria de Louis Fischer, que trabalhou como correspondente em Moscou para os jornais New Republic e The Nation entre 1932 e 1933.

Mobilizando seus contatos na capital soviética, Fischer investigou o material publicado pela Hearst e descobriu vários pontos falhos. Em primeiro lugar, Thomas Walker jamais se aproximou de território ucraniano. Seu objetivo era atravessar o país pelo expresso Transiberiano. Ele entrou pela fronteira com a Polônia em 12 de outubro de 1934, ficou em Moscou do dia 13 ao dia 18, quando embarcou rumo à Manchúria. Deixou a URSS no dia 25 de outubro. Em suma: era fisicamente impossível que ele tivesse visitado as áreas que descrevia em seu artigo.

Fischer também alertou para a inconsistência das imagens. Descobriu que várias delas apareceram em jornais durante a epidemia de fome na região do rio Volga em 1920. A partir deste dado, Tottle, um exímio laboratorista fotográfico, estudou as ilustrações e constatou pesados sinais de manipulação, como evidências de retoques nos negativos.  e verificou que muitas delas nem foram tiradas em território soviético. Com base em sua pesquisa, publicou, em 1987, Fraud, famine and fascism: the Ukrainian genocide myth from Hitler to Harvard.

Apesar disto, estas fotografias são, até hoje, a única fonte usada por publicações anticomunistas para ilustrar os pretensos crimes do regime comandado por Joseph Stálin, como o Livro Negro do Comunismo — escrito em Paris por militantes de direita sem acesso a documentos primários e tendo como base matérias jornalísticas questionáveis.

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CRÉDITO: DIÖZESANARCHIV WIEN/BA INNITZER

Espaço vital e propaganda

Ao lado de Hearst, outro oportunista tentava atingir a União Soviética com a tese do assassinato de milhões de cidadãos pela fome: Adolf Hitler, que assumira o cargo de chanceler da Alemanha em 1933. Em seu livro Minha luta, ele descreveu o que batizou de nacional socialismo (ou nazismo). O povo germânico era descendente da raça ariana, superior às demais, e precisava exercer sua força em busca de um espaço vital para sua expansão. O caminho natural para este processo seria a ocupação dos países controlados por grupos étnicos eslavos, que, na visão hitlerista seriam inferiores.

Hitler via as férteis planícies de terra negra da Ucrânia e outros territórios da União Soviética como alvos naturais de sua política colonialista. Os eslavos, nesta visão distópica, serviriam como mão de obra escrava mantida com rações de subsistência (e sem acesso à educação) para grandes senhores da terra alemães. É preciso lembrar que esta política foi aplicada na invasão da Polônia em 1939, com a execução de milhares de proprietários rurais poloneses por tropas nazistas e a entrega de terras a colonos arianos.

Com a ascensão do nazismo, a imprensa alemã passou a usar a tese do genocídio na Ucrânia como propaganda anticomunista, conseguindo alguma repercussão internacional. Ao ocupar a Polônia, Hitler colocou as mãos em uma importante arma ideológica: Stepan Bandera. Ele sonhava em reunir em um estado todas as regiões de maioria étnica ucraniana, incluindo a Galícia, província onde nascera no então Império Austro-Húngaro.

Colaboracionismo e antissemitismo

Mesmo na cadeia, Bandera colaborou com os nazistas. Em preparação para o ataque à URSS, os alemães recrutaram seus seguidores como policiais de língua ucraniana e para servir em dois batalhões voluntários das SS. Ao trabalhar com os nazistas, ele esperava libertar a Ucrânia do domínio soviético e estabelecer seu próprio governo, aliado da Alemanha. Uma de suas obsessões, compartilhada com Adolf Hitler, era a noção de que os judeus estavam por trás do comunismo e do imperialismo stalinista e deveriam ser destruídos. “Os judeus da União Soviética”, dizia uma de suas declarações, “são os partidários mais leais do regime bolchevique e a vanguarda do imperialismo moscovita na Ucrânia.”

Quando os alemães, na invasão da URSS, ocuparam Lvov, capital da Galícia Oriental, seus partidários lançaram vários pogroms (assassinato em massa de hebreus). “Vamos colocar suas cabeças aos pés de Hitler”, proclamava um panfleto banderista para judeus ucranianos (Leia mais aqui). Em abril de 1943, os alemães organizam a 14ª Divisão de Voluntários da Waffen-SS (Galícia) com recrutas banderistas. As Waffen-SS eram as forças de combate do Partido Nazista. A nova unidade se mostrou aguerrida no combate aos partisans (guerrilheiros) soviéticos e mostrou bravura contra os soldados do Exército Vermelho, mas o nacionalismo ucraniano fora contaminado pelo antissemitismo e pelo sentimento antipolonês. Há evidências de crimes de guerra cometidos pela Galícia na Polônia e na supressão da Revolta Eslovaca em 1944.

Em 17 de março de 1945, a unidade recebeu uma nova denominação: 1ª Divisão do Exército Nacional Ucraniano. Com a tomada de Berlim pelas forças soviéticas e o suicídio de Hitler, o comandante da unidade, general Pavlo Shandruk, decidiu se render ao Exército dos Estados Unidos em 10 de maio. Os 8 prisioneiros de guerra da Divisão Galícia foram deslocados e concentrados na cidade italiana de Rimini.

O governo norte-americano estava sob nova administração. Harry Trumman assumiu a presidência com a morte de Franklin Delano Roosevelt. Visceralmente anticomunista, ele deu uma volta de 180 graus na política do país em relação à União Soviética. Um dos efeitos desta política foi o recrutamento de funcionários nazistas de segundo e terceiro escalões, inclusive Stepan Bandera, para assessorar os aliados ocidentais no combate ao comunismo. Era o início de um conflito ideológico que marcaria o mundo durante quatro décadas, batizado pelo ex-primeiro-ministro britânico, Winston Churchill, como Guerra Fria.

A União Soviética e o novo governo da Polônia, de tendência socialista, exigiam o repatriamento dos prisioneiros para que fossem julgados por genocídio. É bom lembrar que, na época, existiam dois representantes do povo polonês: um localizado em Londres desde 1939 e reconhecido pelos aliados ocidentais; outro, estabelecido em Varsóvia com apoio de Moscou.

O Corpo de Exército Polonês, fiel ao governo de Londres e comandado pelo general Władysław Anders, controlava a região de Rimini. Ele conhecia Pavlo Shandruk desde os tempos de academia militar e reconheceu os remanescentes da Divisão Galícia, “bons católicos e anticomunistas fervorosos”, como cidadãos da Segunda República Polonesa. O papa Pio 12 também interveio a favor dos ex-SS e as autoridades britânicas concederam asilo aos seguidores de Bandera.

Os ex-integrantes da Divisão Galícia conseguiram vistos de residência no Canadá, Estados Unidos e Reino Unido. A partir daí, em seus novos países, deram impulso à tese do genocídio do povo ucraniano que ganhou aí um novo rótulo forjado por Bandera, um criminoso de guerra: Holodomor, palavra que pode ser traduzida como grande forme.

A realidade

Realmente, houve uma epidemia de fome na Ucrânia em 1932 e 1933, causada por um período de seca agravado por um movimento de resistência contra a coletivização da agricultura estimulado pela Igreja Ortodoxa. Os sacerdotes sugeriram que os proprietários de terra, conhecidos como gulaks, queimassem colheitas e plantações e matassem as criações como protesto anticomunista. O resultado foi uma carência de alimentos que afetou toda a União Soviética, mas que nunca atingiu a relevância de um genocídio, ato que implica em uma decisão voluntária de um governo contra uma etnia.

Na década de 1990, os arquivos do Censo Soviéticos foram disponibilizados ao público durante o processo de Glasnost (transparência) promovido pelo último líder da URSS, Mikhail Gorbatchev. O gesto teve pouca repercussão e poucos pesquisadores ocidentais resolveram consultá-los. Judeu e polonês, Moshe Lewin foi um dos poucos que se dispôs a examinar o material. O resultado foi O século soviético, a mais completa e isenta fonte da evolução econômica e demográfica do regime.

Os dados apontados por ele não comprovam a existência do Holodomor. A União Soviética apresenta um crescimento demográfico constante entre 1920 e 1939. A população saltou de 120 milhões para 198 milhões, o que não seria possível com a perda de 3 milhões de habitantes. Mesmo nos anos de fome, a Ucrânia apresentou um aumento de 275 mil pessoas. O livro também destaca a movimentação de contingentes populacionais da república para outras unidades do país que promovia grandes obras de infraestrutura. A população étnica ucraniana realmente sofreu uma queda de 3 milhões de pessoas, mas isto se explica com a reclassificação da população de cossacos, que passaram a ser considerados como um grupo próprio.

A fome em massa não se limitou à Ucrânia, atingiu também as outras regiões agrícolas da URSS no norte do Cáucaso e nas regiões do Don; Médio e Baixo Volga; em todas as áreas com terras negras da Rússia, no sul dos Urais e no Cazaquistão. Durante o período de dois anos, 500 mil pessoas morreram em uma grande tragédia, mas distante dos números apontados pela propaganda ocidental. É importante lembrar que outras áreas da Europa passaram por grandes secas nos anos de 1932 e 1933, principalmente na França, mas as colônias conseguiram suprir a quebra da produção.

O que é genocídio

A Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a prevenção e punição do crime de genocídio, de 9 de dezembro de 1948, afirma de forma clara e inequívoca que o genocídio é entendido como ações “cometidas com a intenção de destruir, no todo ou em parte, qualquer entidade nacional, étnica, racial ou grupo religioso como tal.” Isto não pode ser comprovado pela documentação deixada pelo colapso da União Soviética, que está aberta ao público e pode ser consultada por pesquisadores.

O principal defensor do conceito de “Holodomor-genocídio”, Kulchitsky, foi forçado a admitir:“temos uma base documental exaustiva para responder às questões de como os camponeses foram eliminados, mas não há documentos sobre por que eles foram mortos.” Na verdade, existem muitos documentos sobre por que a fome em massa começou, mas eles não se encaixam no conceito de genocídio e os historiadores revisionistas ucranianos preferem ignorá-los.

O decreto do Comitê Executivo Central e do Conselho dos Comissários do Povo da URSS de 1932 Sobre a Proteção da Propriedade das Empresas Estatais, Fazendas Coletivas e Cooperação e o Fortalecimento da Propriedade Pública (Socialista) — a chamada Lei sobre propriedade cooperativa — não contém uma palavra em relação aos ucranianos ou aos cidadãos de qualquer outra nacionalidade.

O decreto do Comitê Central do Partido Comunista da União (Bolcheviques) e do Conselho dos Comissários do Povo da URSS, de 14 de dezembro de 1932, Sobre as aquisições de grãos na Ucrânia, no Norte do Cáucaso e na Região Ocidente, assinado por Viatcheslav Molotov e Joseph Stalin, citava todas as regiões agrícolas da URSS e não se restringia a Ucrânia.

Nele, foi proposto ao Comitê Central do PC (b) U e ao Conselho dos Comissários do Povo da Ucrânia para “prestar muita atenção à correta implementação da ucranização, eliminar sua implantação mecânica, expulsar Petliura (Symon Petliura, líder do movimento nacionalista entre 1918–1921) e outros elementos nacionalistas burgueses do partido e das organizações soviéticas, para selecionar e educar cuidadosamente os quadros bolcheviques ucranianos, para garantir a liderança partidária sistemática e o controle sobre a implementação da ucranização.”

Aqui podemos falar sobre a repressão e a luta interna do partido contra a dissidência, mas não há indícios de genocídio contra os ucranianos. Aliás, o processo de formação estabelecido pelo Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética abria uma série de concessões às repúblicas, inclusive o ensino dos idiomas locais ao lado do russo, o que não era permitido nos tempos do Império Russo.

Brasil e o Holodomor

O Brasil abriga uma grande população de ucraíno-descendentes. O Holodomor foi reconhecido no Parana, Rio de Janeiro e em cidades pequenas que abrigam diásporas ucranianas importantes. Comissões da Câmara dos Deputados também apoiaram moções a favor, como a de Direitos Humanos e das Minorias e a de Educação e Cultura. A grande questão está em atribuir à Rússia os atos da cometidos pela União Soviético quanto estava sob o comando de um georgiano.

A Ucrânia já causou sérios danos ao Brasil, ao não cumprir os compromissos assumidos com a criação da Alcântara Cyclone Space (ACS), empresa binacional que pretendia explorar o serviço de lançamentos de satélites a partir do Centro de Lançamento de Alcântara. O governo de Kiyv engoliu US$ 250 milhões dos cofres nacionais sem entregar nenhuma tecnologia, o que levou a ex-presidenbte Dilma Rousseff a denunciar o tratado.

Brasil e Rússia possuem uma boa parceria forjada na criação do BRICS — bloco formado por Brasil, Rússia, índia, China e África do Sul. Usamos satélites russos para monitorar nosso território e o clima. Além disto, recebemos financiamento do Banco do BRICS que dependem da aprovação de todos os sócios da entidade. Há algum sentido comprar dados falaciosos criados a partir de matérias sensacionalistas, interesses ideológicos e encobrimento de fracassos? Obviamente não.

A grande fome de 1932 foi uma grande tragédia, mas não se limitou ao território ucraniano. Quinhentas mil pessoas morreram em toda a União Soviética. Está na hora de se embasar nossos caminhos diplomáticos na realidade e não em mentiras.

Por Pedro Paulo Rezende