A cidade de Belém, capital do Estado do Pará, será palco da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), evento que reunirá líderes mundiais para debater o futuro ambiental do planeta e as estratégias globais de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. No entanto, a pauta ambiental da COP30 transcende os limites da ecologia: ela toca diretamente o campo da saúde pública e, portanto, também do Direito Médico e da Saúde. As alterações climáticas afetam determinantes essenciais da saúde humana — o ar, a água, o alimento e o abrigo. Ondas de calor, poluição atmosférica, escassez hídrica, vetores de doenças tropicais e eventos climáticos extremos repercutem sobre a saúde física e mental das populações. Nesse contexto, emerge a necessidade de um olhar jurídico-sanitário mais abrangente, capaz de compreender o ambiente como elemento essencial à concretização do direito fundamental à saúde, previsto no artigo 196 da Constituição Federal de 1988.

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E SEUS REFLEXOS SOBRE O DIREITO À SAÚDE
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece que a crise climática é também uma crise de saúde. O aumento da temperatura média global provoca o surgimento e a expansão de doenças infecciosas, agrava quadros respiratórios e cardiovasculares, compromete a segurança alimentar e intensifica situações de vulnerabilidade social. Na Amazônia, região estratégica e biologicamente sensível, tais impactos se agravam em razão da precariedade de infraestrutura sanitária, da alta incidência de doenças tropicais e da desigualdade no acesso aos serviços de saúde. Diante desse cenário, o Direito da Saúde passa a ser instrumento de concretização da justiça climática, exigindo do Estado e das instituições de saúde a adoção de políticas preventivas, de adaptação e de mitigação de riscos. Essa integração normativa entre meio ambiente e saúde é amparada pelos princípios da prevenção, da precaução e da solidariedade intergeracional, previstos na legislação ambiental e compatíveis com a ordem constitucional brasileira.

O PAPEL DO DIREITO MÉDICO PREVENTIVO
O Direito Médico Preventivo, corrente que busca antecipar litígios e promover a segurança jurídica na saúde, assume protagonismo nesse debate. Sua essência está na atuação antecipatória e educativa, voltada à gestão de riscos, à elaboração de protocolos, à conformidade ética e normativa e à proteção da relação médico-paciente. Quando aplicado ao contexto climático, o Direito Médico Preventivo amplia sua esfera de atuação: passa a compreender o risco ambiental como um dos fatores determinantes da saúde e, portanto, como elemento integrante da responsabilidade institucional e profissional. Hospitais e clínicas, por exemplo, devem incluir em seus planos de contingência medidas voltadas à adaptação climática, gestão de resíduos, eficiência energética e continuidade dos serviços de saúde em situações de emergência ambiental. Assim, a prevenção jurídica ganha uma nova dimensão: não apenas evitar litígios médicos, mas prevenir danos coletivos à saúde decorrentes da crise ambiental. Trata-se de um avanço conceitual e ético, que reposiciona o Direito Médico Preventivo como ferramenta de sustentabilidade e governança institucional.
SAÚDE, EQUIDADE E JUSTIÇA CLIMÁTICA
As mudanças climáticas acentuam desigualdades históricas. As populações mais pobres, indígenas, ribeirinhas e periféricas sofrem de forma desproporcional os efeitos da degradação ambiental. Nesse contexto, o Direito da Saúde deve operar sob o prisma da equidade, garantindo o acesso universal e igualitário a serviços de saúde adequados às novas ameaças climáticas. A justiça climática exige uma abordagem interdisciplinar: o médico, o gestor e o jurista precisam compreender que a proteção da vida humana está vinculada à proteção do meio ambiente. A integração entre bioética, saúde pública e direito ambiental é o caminho para uma resposta efetiva à crise global.
BELÉM E A AMAZÔNIA COMO EPICENTRO DE UM NOVO PARADIGMA
A escolha de Belém como sede da COP30 tem significado simbólico e prático. A Amazônia é, simultaneamente, o pulmão do mundo e uma das regiões mais afetadas pelas mudanças climáticas. Ao sediar o evento, a capital paraense se transforma em laboratório mundial de inovação socioambiental, convidando gestores, profissionais da saúde e operadores do direito a construírem modelos sustentáveis de cuidado e prevenção. Para os profissionais do Direito Médico e da Saúde, trata-se de um chamado à ação: revisar práticas, adaptar contratos, promover capacitações e incorporar cláusulas de responsabilidade ambiental e sustentabilidade nas relações institucionais. O hospital do futuro será não apenas tecnológico e humanizado, mas também ambientalmente responsável e juridicamente preventivo.

CONCLUSÃO
A COP30 representa mais do que uma conferência global sobre o clima, é um marco civilizatório que impõe aos sistemas de saúde e de justiça novos deveres éticos e jurídicos. O Direito Médico Preventivo, ao articular a gestão de riscos com a proteção da vida, desponta como instrumento estratégico na era das mudanças climáticas. Cuidar do planeta é cuidar da saúde humana E prevenir, no âmbito jurídico e médico, é garantir não apenas a ausência de litígios, mas a preservação da vida em um ambiente saudável e sustentável.
Por Giovani Luís Padão Merenda
Gestor Hospitalar há 31 anos, atuando atualmente em Belém/PA, Administrador de Empresas, pelo CEULP/ULBRA, Especialista em Administração Hospitalar, Formando de Direito pela UNAMA- Belém/PA, Especializando em Direito Médico e da Saúde.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
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BRASIL. Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080>. Acesso em: 21 de outubro de 2025.
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ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Climate crisis is a health crisis – WHO urges urgent action ahead of COP30. Brasília, 2025.
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ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). United Nations Climate Change Conference – COP30, Belém 2025. UNFCCC.
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MINISTÉRIO DA SAÚDE. Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima – Eixo Saúde. Brasília, 2023.
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HASHIMOTO, Alexandre. Gestão de Sustentabilidade em Organizações de Saúde: um estudo de caso brasileiro. São Paulo: Leader Editora, 2023.
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BRASIL. Decreto n° 7.746, de 5 de junho de 2012. Regulamenta o art. 3° da Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993, para estabelecer critérios e práticas para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável nas contratações realizadas pela administração pública federal direta, autárquica e fundacional e pelas empresas estatais dependentes, e institui a Comissão Interministerial de Sustentabilidade na Administração Pública – CISAP. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/decreto/d7746.htm>. Acesso em: 23 de outubro de 2025.
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BRASIL. Conselho Nacional de Saúde. Subsídios para construção da Política Nacional de Saúde Ambiental. Brasília: Editora do Ministério da Saúde, 2007.
