Belém 408 anos: Cidade obrigada a olhar para o futuro presa por suas amarras do passado – Por Patrick Paraense

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Belém 408 anos: Cidade obrigada a olhar para o futuro presa por suas amarras do passado - Por Patrick Paraense
Fotos: AP

Belém é uma cidade com complexidades e desafios proporcionais ao seu tamanho, a sua beleza, à expectativa e à necessidade da sua população. Mas, para além de celebrar o aniversário da nossa capital – a maior entre os estados do Norte e uma das cidades mais importantes do país – acreditamos que devemos fazer uma avaliação realista do momento que vivemos. Afinal, além de tudo, este é um ano eleitoral, e provavelmente será uma das eleições mais acirradas e importantes da nossa história.

Devemos lembrar que essa é uma cidade que cresceu desordenadamente, que ao longo das décadas não teve condições de planejar um modelo de desenvolvimento a longo prazo e onde os ciclos econômicos foram vivenciados em exaustão. Não foram pensadas alternativas econômicas de geração de emprego e renda aliando nossas potencialidades em recursos naturais e viabilizando uma industrialização da cidade em diversos modais.

Isso trouxe consequências gravíssimas para a viabilização de alternativas a uma população que ultrapassa 1,3 milhões de habitantes.
Apesar de figurar entre as 100 cidades com os maiores índices do PIB Brasil, Belém deixou de ser a maior economia do Pará. A capital ficou atrás de Canaã dos Carajás e Parauapebas, respectivamente. Segundo dados recentes do IBGE.

Por outro lado, em relação à arrecadação, Belém tem a maior entre as cidades do estado. Porém, há um déficit orçamentário de quase R$2 bilhões, tornando a capital praticamente inadministrável se não mudarmos urgentemente a nossa concepção, vocação econômica e de cidade. Além disso, a capital já perdeu 6% de sua população desde 2010, segundo dados do Censo de junho de 2022.

A verdade é que Belém está sendo penalizada pelo seu passado e, ao mesmo tempo, sendo obrigada a olhar para o futuro em um cenário extremamente caótico. A saber, nos últimos 20 anos podemos afirmar que caminhamos para trás.

Diante disso, chegamos em 2024 com uma eleição totalmente em aberto. De um lado, temos o atual prefeito em busca da reeleição para o seu 4º mandato. De outro, temos uma gama de candidatos que se apresentam como soluções para a capital paraense. E para analisar tal cenário é preciso recorrer à história recente.

As duas primeiras gestões do Edmilson (1997-2004), por mais que não tenham conseguido superar os desafios econômicos e financeiros, tiveram avanços significativos para a nossa cidade, ao menos no campo da participação popular, conquistas de direitos e mobilização social. Em um momento igualmente adverso, a imagem do prefeito e uma comunicação objetiva, alinhada à linguagem popular, permitiram que a gestão fosse considerada uma gestão exitosa.

De lá para cá foram 16 anos de administrações desastrosas, com Duciomar e Zenaldo que colocaram Belém em uma curva descendente acentuada em diversos indicadores e que, nesse terceiro mandato, Edmilson não deu conta de reverter. Entre os motivos deste aparente fracasso, talvez esteja a relação entre a expectativa gerada na campanha e a realidade imposta pelos gargalos políticos e econômicos da gestão e da cidade.

As eleições de 2020 ocorreram em meio a tragédia global da COVID-19. Onde o Governo Bolsonaro – e sua política genocida – frente ao maior desafio imposto à humanidade no último período, deixaram marcas profundas nos municípios, principalmente em relação às questões econômicas, um dos maiores retrocessos desde a redemocratização do Brasil e, seguramente, o maior revés desde o Plano Real, o que teve impacto direto na arrecadação e no orçamento de Belém.

Dito isso, faz-se necessário lembrar que nos dois primeiros mandatos de Edmilson, por razões diferentes, a situação do caixa da Prefeitura também não era boa. Porém, naquele momento, Edmilson conseguiu se reeleger com uma estratégia correta ao polarizar e apontar a culpa a quem era devida: o Governo Estadual naquele período.

Hoje, ao contrário, a no mínimo duvidosa capacidade de leitura política do grupo do prefeito, aliada à trágica comunicação do governo municipal formam a receita perfeita para a crise. A popularidade de Edmilson nunca foi tão baixa. Entre os acertos da administração e os erros de comunicação, o Edmilson atual sublima a própria gestão e não consegue dialogar com a população para criar uma linha narrativa de defesa de seu governo.

Enquanto que nos primeiros mandatos, o prefeito e sua equipe conseguiram colar nos governos Almir e Jatene a culpa pelo pouquíssimo dinheiro em caixa, fazendo com que a “falta de repasse do ICMS” fosse a pauta que polarizou politicamente a cidade, a atual comunicação do Prefeito Edmilson apresentou um ”vilão tardio” em sua narrativa. Somente agora, após a eleição de Lula e a reeleição de Helder – ambas históricas – Edmilson passou a sinalizar a culpa do ex-presidente e seu governo criminoso como os principais responsáveis pela crise que vive a cidade.

Não que a narrativa não esteja corretíssima, só que mais uma vez perde-se uma oportunidade, pois se a gestão tivesse feito exatamente o que fez 20 anos antes e polarizado com Bolsonaro acerca da sua negligencia criminosa com a capital mais importante da Amazônia. Mas ao tentar abrir esse debate com o ex-presidente já fora do governo, justamente num momento em que a economia brasileira e a do Pará estão em recuperação, a prefeitura fica com o seu discurso no vazio sem criar conexão com a população.

As eleições de 2022 acabaram com uma Belém tão polarizada quanto o Brasil, mesmo com Helder consolidando a maior hegemonia política da história do Pará, em uma reeleição espetacular com mais de 70% dos votos no primeiro turno, no segundo turno, mesmo com toda a força de Helder na capital, a diferença entre o eleito Lula e o derrotado Bolsonaro foram de menos de 5 mil votos. Mostrando uma tendencia que dita a realidade da polarização.

O momento atual com a liderança de Helder potencializada e a relação privilegiada com o presidente Lula, tem feito com que a Amazônia, principalmente a capital paraense, tenham recebido uma atenção e investimentos jamais vista na história, trazendo oportunidades de programas, projetos, ações e recursos que podem transformar muitas coisas na cidade. Como a realização da Cúpula da Amazônia e o anúncio da COP 30 em 2025, veio também a destinação de recursos bilionários necessários para viabiliza-la. Uma oportunidade única de fazer Belém dar um salto e apresentar-se ao Brasil e ao mundo de outra forma.

Ainda no ano passado, a Cúpula da Amazônia mostrou muitos dos gargalos que Belém terá que superar para a realização da COP 30, principalmente, em relação a sua infraestrutura, rede hoteleira e de mobilidade. Mas é a limpeza urbana que tem se demonstrado quase como um desafio intransponível, ao menos na percepção da população.

Nos últimos dias, o prefeito anunciou a licitação do serviço de limpeza urbana, que promete ser, nas palavras de Edmilson, uma grande revolução – agradecendo a população pela “paciência”. Na ocasião, anunciou um “Limpezão” na cidade com ampla divulgação nos canais de comunicação, reunindo caminhões, funcionários da empresa de limpeza e todo o primeiro escalão de comissionados da administração municipal na Aldeia Cabana – confrontando a propaganda e mobilização política com a realidade objetiva dos fatos e a impressão que a população está no momento, fazendo lembrar as paradas militares anedóticas da Coréia do Norte de Kim Jong-un. Como resposta, nas redes sociais “pipocam” memes e vídeos de influenciadores locais com críticas ao que a população vê como má gestão, descaso e abandono.

Isso demonstra, ferozmente, a dificuldade da prefeitura em lidar com os novos paradigmas da comunicação. Como resultado, hoje, o prefeito de Belém tem mais de 70% de desaprovação. E isso se reflete no cenário de intenção de votos para esse ano. Já que o Prefeito de Belém é o que tem a pior avaliação entre os gestores das capitais brasileiras.

Talvez fosse mais inteligente abrir mão da insistência em forçar a imagem do Prefeito como fiador da gestão e tentar inverter a lógica, dar um descanso para a imagem do próprio Edmilson e fazendo com que as ações do governo assumam o protagonismo da comunicação institucional, daí apostando na estabilização de uma visão mais positiva da população em relação a prefeitura, para que o Prefeito possa se reapresentar como o “único” capaz de juntar Lula e Helder e avançar nas parcerias e busca de recursos aproveitando a oportunidade da COP 30 para fazer a cidade mudar seu estágio atual

Nas últimas pesquisas, os candidatos da extrema-direita, Eder Mauro e Eguchi, aparecem melhor posicionados nas intenções de voto. É preciso acendermos o alerta para o que ambos representam: a extrema-direita, o discurso populista, o retrocesso que o bolsonarismo foi para o Brasil e a verdadeira catástrofe frente uma cidade com problemas crônicos como os de Belém.
Outros nomes se apresentam à disputa, como o deputado estadual Thiago Araújo, um dos candidatos derrotados em 2020, que se alinha ao discurso do bolsonarismo e aposta na narrativa de “terra arrasada”, além do deputado estadual licenciado e prestes a aportar no MDB de Helder – Igor Normando, que é o atual Secretário de Articulação e Cidadania do Governo do Pará, pasta que dirige a principal política pública do governador: As Usinas da Paz. A “menina dos olhos” de Helder.

Apesar da vitória de Lula e dos dados positivos do atual governo brasileiro, Bolsonaro e o bolsonarismo ainda tem força política, capacidade de mobilização e não devem ser subestimados. Dito isso, Lula e Helder (e Bolsonaro) têm que ser lidos como os principais cabos eleitorais no Pará.

Edmilson está longe de ser carta fora do baralho. Na verdade, é difícil imaginar um cenário em que ele não esteja no segundo turno. Justamente por estar à frente da máquina, ter apoio do presidente Lula e provavelmente manter o apoio de um PT fortalecido com as ações e popularidade do governo federal.

Mas o atual momento e a dura realidade dos fatos deveriam ser o sinal necessário para o grupo político do prefeito dar uma guinada em relação à articulação política, comunicação pessoal e institucional do gestor e da prefeitura. Tudo isso somados a uma mudança drástica na postura de como se lida com as críticas vindas de qualquer lado.
Mas, sendo sincero, acho muito mais fácil ganhar a mega da virada do que o ED e seu núcleo duro mudar alguma coisa, pois não são vocacionados à reflexão e à autocrítica.

Patrick Paraense – Diretor da Troika Inteligência Politica e especialista em comunicação institucional e política.