Com mais uma queda na taxa Selic, que ontem registrou novo piso histórico, o Banco Central jogou uma pá de cal nos investimentos de renda fixa. Com os juros básicos da economia a 5,0% ao ano, aplicações conservadoras como a caderneta de poupança e parte significativa dos fundos DI perdem para a inflação projetada para os próximos 12 meses.
A partir de agora, quem depositar R$ 1 mil na caderneta de poupança corre o risco de sacar, depois de 12 meses, um valor equivalente a R$ 998. Os R$ 2 de diferença deverão ser corroídos pela inflação, estimada em 3,54% para os próximos 12 meses, segundo o último relatório Focus, do Banco Central.
Destino de oito em cada dez investidores brasileiros, a poupança tinha R$ 818 bilhões em 24 de outubro, quase 16% dos recursos aplicados na renda fixa. A regra de rentabilidade da aplicação mais popular do País é 70% da Selic acrescida da Taxa Referencial (TR), que hoje está zerada. Com o corte de 0,5 ponto porcentual da taxa básica de juros, o rendimento da poupança recua de 3,85% para 3,43% – 0,11% abaixo da projeção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), inflação oficial, do período.
Situação similar acontece com os fundos de renda fixa, chamados de fundos DI. Segundo cálculos da professora de economia Paula Sauer, da ESPM, todos os fundos da categoria com taxa de administração igual ou superior a 0,50% ao ano já perdem para a inflação, entregando na prática retorno negativo aos seus investidores (ler mais abaixo).
Garimpo
Hoje, existem 3.165 fundos de renda fixa no mercado. Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) apontam que 41,16% deles cobram taxas a partir de 0,50% ao ano. “É uma situação que tende a piorar, já que a Selic vai continuar caindo. Os investidores vão precisar garimpar fundos mais baratos e cada número depois da vírgula conta”, afirma.
Para os especialistas, o momento é de ruptura no cenário de investimentos. Com a indicação de novas quedas na Selic, dificilmente o retorno real de uma aplicação conservadora, descontados impostos e inflação, conseguirá ultrapassar 0,50% ao ano. Tirando os casos que já trazem margens negativas, a tendência é de que os produtos clássicos, como o Certificado de Depósito Bancário (CDB), títulos do Tesouro Selic e Letras Financeiras (LCA e LCI) tendam ao zero a zero.
“A renda fixa acabou”, brinca Helena Veronese, economista-chefe do braço de investimentos da Azimut Brasil. “Claro que ainda restam produtos interessantes, sobretudo os de crédito corporativo, como as debêntures. Mas é inevitável ampliar a exposição a risco para capturar um pouco mais de rendimento”, afirma.
“Quem tem dinheiro na poupança quer segurança e simplicidade e, acho, não vai ter uma migração em massa de lá. Quem deve perder mais são os fundos DI e os CDBs, porque têm investidores mais propensos a procurar aplicações com maior rentabilidade”, diz Gilberto Abreu, diretor de investimentos do banco Santander.
Perspectivas
Especialistas se dividem sobre qual devem ser os impactos dos juros no cenário de investimentos. Enquanto para uns o efeito deve ser mitigado por um alongamento dos prazos para sacar o dinheiro (com títulos que vencem em 20 a 25 anos), para outros, assumir risco dentro do novo mundo da renda variável será a opção imediata.
O presidente do BNP Paribas Asset Management, Luiz Sorge, acha que é mesmo inevitável que o investidor migre para o risco. Ele vê boas oportunidades em crédito privado provenientes de empresas da área de infraestrutura, as debêntures incentivadas. “O Brasil vai voltar a crescer e, a partir do ano que vem, a gente espera um aumento de oferta de fundos de infraestrutura no mercado.” Para ele, ações, ETFs (fundos de índices, como o que segue o Ibovespa) e ativos no exterior também devem integrar a carteira dos clientes, daqui para a frente.
Helder Soares, da gestora Claritas, também coloca os fundos imobiliários no pacote. Essa categoria, que tende a antecipar uma melhora no mercado de incorporações, atingiu 1 milhão de cotistas no primeiro semestre, segundo a Anbima.
Para Thiago Salomão, analista da Rico Investimentos, o caminho passa obrigatoriamente pelo mercado de ações. “Eu recomendo ações. Digo aqui que até entendo um cliente que não quer investir em renda fixa, mas não dá para entender quem não tem nada de ações em sua carteira. Que seja 1%”, afirma.