A Constituição prevê a possibilidade de uma intervenção militar?

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Pedido de parte dos caminhoneiros grevistas por uma ‘intervenção militar constitucional’ que conduza país até a próxima eleição não tem qualquer amparo jurídico, dizem juristas.

Na últimas semanas, com a crise provocada pelo movimento grevista de caminhoneiros em todo o país, voltaram a surgir nas redes sociais e em faixas espalhadas nas estradas pedidos por uma certa “intervenção militar constitucional”, que daria a membros das Forças Armadas o poder para governar o país. Mas, apesar do uso do termo “constitucional”, tal medida não tem nenhum fundamento jurídico. Na realidade, demandas do tipo são baseadas em interpretações equivocadas da Constituição, segundo juristas.

De acordo com os especialistas, diferentemente do que argumentam militantes polítcos que defendem a intervenção, a Constituição não prevê qualquer cenário em que militares possam assumir o poder, ainda que com missão e prazo delimitados.

A hipótese de uma intervenção também é rechaçada pelos comandantes das Forças Armadas, que citam os riscos de um retrocesso institucional no país.

“Qualquer intervenção em que os militares assumam o poder equivaleria a uma ruptura institucional e a um golpe de Estado”, diz Daniela Teixeira, vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Distrito Federal

‘Limpeza ética’

Em grupos de apoiadores da greve no WhatsApp e no Facebook, além de outros movimentos, são comuns os pedidos por uma intervenção militar temporária, que promova uma “limpeza ética” no governo e conduza o país até a próxima eleição.

Segundo os difusores da ideia, esse tipo de intervenção seria diferente de um golpe ou da imposição de uma ditadura militar.

“Em 1964 as leis eram outras, eram outros tempos”, diz num áudio que circula em grupos de WhatsApp um homem que se identifica como militar da reserva da Aeronáutica. Ele diz que, nos golpes, os militares agem por conta própria. Já em intervenções, segundo ele, “as forças são convocadas a agir pela população” – fator que conferiria legalidade aos atos.

O autor defende a realização de grandes manifestações pró-intervenção pelo Brasil. “Aí teremos o respaldo do mundo e da ONU, senão a ação cai por terra.”

No grupo do Facebook “Adeptos da INTERVENÇÃO CONSTITUCIONAL DAS FFAA” (Forças Armadas), um membro que também se identifica como militar na reserva defende a convocação imediata “de uma Junta Civil e Militar Constitucional que dirija os destinos da Nação com Ordem e Progresso até as próximas eleições, sem urnas eletrônicas viciadas e fraudadas”.

Segundo o autor, a iniciativa garantiria que “bandidos e corruptos presos cumpram realmente suas penas” e que “a população se sinta mais segura e protegida”.

Subordinação ao presidente

Todos os juristas ouvidos pela BBC Brasil, no entanto, afirmam que a Constituição não dá respaldo a qualquer ação desse tipo e que a tomada de poder pelos militares – ainda que temporária – equivaleria a um golpe. E caso os militares exerçam o poder de forma autoritária e suspendam liberdades individuais para cumprir seus objetivos, como fizeram após o golpe de 1964, o novo regime seria uma ditadura.

Para Elival da Silva Ramos, professor de Direito Constitucional da USP e ex-procurador geral do Estado de São Paulo, a Constituição claramente subordina as Forças Armadas ao presidente da República.

No artigo 142, a Carta diz que as “Forças Armadas (…) são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

Segundo Ramos, é esse o trecho que legitima o emprego de militares em crises de segurança pública – caso, por exemplo, do decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) que ampara a presença atual de militares no policiamento do Rio de Janeiro.

Mesmo nesses casos, porém, a iniciativa de convocar as tropas cabe ao presidente da República e deve ser aprovada pelo Congresso. E há limites à ação das tropas. “O presidente não pode decretar uma intervenção nos demais poderes, por exemplo”, diz o professor.

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Fonte: Terra

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