Prefeita Patrícia | Representação democrática é um direito das mulheres em todo o mundo, assim como igualdade e justiça de gênero são indicadores do quão democrático é um sistema político. Por isso, a legislação vem se aprimorando cada vez mais em favor da ocupação de cargos eletivos ou por nomeação por mulheres, como, por exemplo, a obrigatoriedade de cotas de representação na lista de candidaturas e reserva de assentos.
Todavia, a ocupação dos espaços de poder por mulheres está longe de caminhar pacificamente com o exercício do direito à segurança, isso porque ainda está impregnado no pensamento machista que lugar de mulher é no âmbito mais privado, e de que à ela deve ser atribuído socialmente apenas o papel de satisfação da lascívia masculina, bem como os cuidados com a casa e dos que vivem nela, logo, quando uma mulher ousa adentrar na esfera pública é alvo de violência política instantaneamente, seja de forma velada ou escancarada.
A exposição do caso da Prefeita Patrícia dançando de biquíni nas redes sociais e as manchetes dando conta de que ela estava “sensualizando” é um caso típico de violência política sexista, segundo o qual a tentativa de manchar a imagem da primeira mulher eleita para chefiar o poder executivo do município de Marituba/PA perante o público conservador, crescente no Brasil, é a clara execução de um projeto arquitetado para extirpá-la do seu lugar público e, em consequência, fazer jus a estatística de baixa representatividade feminina na política brasileira.
O viés de gênero pode ser observado na cobertura realizada pela mídia digital acerca de um vídeo em que a Prefeita, em momento de lazer, dança forró de biquíni, foi postado em seu perfil fechado do Instagram e posteriormente “vazado”, pode ser entendido como uma forma coercitiva de controle patriarcal do acesso e permanência das mulheres ao poder institucionalizado, tal qual ocorreu com as manifestações pró impeachment da Ex presidente Dilma Rousself em 2016.
Afinal, quem não lembra dos adesivos distribuídos em 2015, para serem colados nos automóveis, em que a imagem da Ex presidente Dilma foi exposta de pernas abertas simulando um estupro? Ao longo da cadeia que antecedeu o impeachement da primeira mulher eleita presidente do país, a violência política sexista tinha um objetivo muito certeiro: a atribuição de ingovernabilidade a ela. É como se a mulher servisse ao sexo e várias outras coisas, menos para liderar o Governo Federal.
Além disso, os estereótipos e estigmas fortemente atribuídos à figura feminina são formas de dominação masculina e disciplinamento das mulheres, os quais se relacionam a um conjunto arraigado de crenças sobre atributos pessoais “mais adequados” social, política e culturalmente. Uma engrenagem perversa que não encontra outra justificativa, senão a de manter os privilégios masculinos do mandato, que emana do lugar de confraria masculina e branca na política.
As manchetes ironizam um conteúdo que diz respeito a vida privada da Prefeita e não guarda nenhuma relação com sua atuação profissional, se isso não é violência política sexista não temos outra definição, vejamos:
Segundo Marlise Matos , atos de violência política têm ‘alvos privilegiados’: mulheres- especialmente as feministas, LGBTs, negros/as, pobres, nordestinos, ‘petralhas’, entre outros e, quando são perpetrados, a voz pública e democrática também é violada, a voz dos que participam do seio social em coletivo, mobilizam, influenciam e lutam por justiça.
Vale frisar que a Prefeita Patrícia é nordestina e incomoda amplos setores da oposição, inconformados com o percentual de 71% dos votos válidos que recebeu nas eleições de 2024 e a reelegeram Prefeita em Marituba/PA, querem retroceder ao padrão colonial e patriarcal existente em toda a história do município que a antecedeu.
A tentativa de manchar a imagem pelo viés da violência política sexista foi bem sucedida? Me parece que não, pois a popularidade da Prefeita aumentou, ela ganhou 60 mil seguidores em um único dia em seu perfil profissional do Instagram, pulverizaram notas de solidariedade de diversas autoridades em seu favor e segue trabalhando com um sorriso largo no rosto.
Do limão à limonada: a temática ganhou merecidamente o registro, pois projetos golpistas que se iniciam com a tentativa de manipular a opinião pública como este, tornam a corrida eleitoral mais difícil e excludente às pessoas do sexo feminino e quanto a isso a Prefeita soube gerir a crise de imagem pela manchete na mídia digital e defender muito bem seu espaço.
Quanto aos responsáveis pela divulgação do vídeo devem ser ao menos investigados, caso contrário isso é mais uma demonstração de ineficiência do Estado, que deveria ser o principal promotor da defesa da democracia e protetor do direito à segurança das mulheres, refletindo mais uma vez, processos frágeis e inacabados de consolidação democrática.
Cleidiane Martins Pinto, advogada com atuação em direito eleitoral, mestre em direito pela UFPA, Especialista em Direito Tributário pelo IDP, pesquisadora do grupo Tributação e Gênero da FGV e Estudante de MBA em Marketing Político pela USP.