É o caso, por exemplo, dos senadores Aécio Neves (PSDB-MG), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e do deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ)
Pelo menos 12 senadores e 36 deputados com inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da Operação Lava Jato, ficariam sujeitos à perda do foro privilegiado, segundo a interpretação da nova regra em votação na Corte. Isso porque a maioria dos casos envolve investigações de recebimento de propina, via caixa 2, para políticos que já exerciam mandatos no Congresso e tentavam a reeleição ou novo cargo no Executivo.
É o caso, por exemplo, dos senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e Gleisi Hoffmann (PT-PR) e dos deputados Rodrigo Maia (DEM-RJ), Cacá Leão (PP-BA) e Celso Russomanno (PRB-SP). Todos negam uso de caixa 2 e afirmam que as doações foram contabilizadas dentro da legislação eleitoral.
Para especialistas, a perda ou a manutenção do foro, para as autoridades, não deve ser automática. A decisão – mesmo com aprovação da nova regra nesta quarta-feira (2/5), pelo plenário do STF – deverá ser tomada caso a caso, de acordo com a interpretação dos magistrados sobre o crime ter ou não relação com o mandato do investigado. Para analistas, a definição de quando se dá essa relação pode levantar dúvidas e dificultar a aplicação da nova regra.
Em seu voto, o relator da matéria, ministro Luís Roberto Barroso, afirmou que o foro só deve ser observado nos casos de imputação de crimes cometidos no atual exercício do cargo e em razão dele. A tese, já seguida por outros sete ministros, deixa claro que para um caso de agressão doméstica cometido por um parlamentar, por exemplo, não terá julgamento pelo Supremo, por não ter relação com o cargo. Mas não responde se um deputado em campanha pela reeleição suspeito de receber caixa 2 deve ter seu inquérito encaminhado à 1ª instância.
“Delimitar se o crime ocorreu no exercício do mandato não é difícil. O difícil é definir se ocorreu em razão do mandato. O parlamentar negociou e recebeu caixa 2 porque já estava no cargo? Essa foi a condição? Se esse foi o entendimento, então o caso continuará no STF. Mas cada juiz pode avaliar de uma maneira”, disse o mestre em Direito Público Ivar Hartmann, da FGV-Rio. Segundo estudo da instituição, apesar das dúvidas, só 5% das ações penais contra autoridades que tramitaram entre 2007 e 2016 ficariam na Corte.
Clareza
Na visão de Fernanda de Almeida Carneiro, professora do Instituto de Direito Público de São Paulo, o voto de Barroso deixa claro as diferenças entre os casos a serem julgados pelo Supremo, mesmo quando o crime for relativo à caixa 2. Segundo ela, a interpretação caso a caso não será difícil, apesar de necessária.
“Uma pessoa que tenha recebido repasse indevido antes de se tornar deputado ou deputada não tem prerrogativa de foro porque o crime está relacionado à expectativa de cargo e não à função em si, que ainda não era ocupada. Já no caso de um político no exercício do seu mandato receber dinheiro para se reeleger, aí sim há prerrogativa de foro”, afirmou, com base no voto de Barroso.
Segundo Fernanda, o fim do foro é fundamental para “desafogar” os tribunais superiores sem estrutura para julgar a quantidade atual de casos. “Na prática, acontece de pessoas com foro dificilmente serem condenadas e os casos, em sua maioria, prescreverem. É uma sensação de impunidade muito forte.”
“Limpa”
Assegurar essa “limpa” dos processos parados no Supremo seria um avanço para a Justiça na avaliação do professor do curso de Direito Público da PUC-SP, Eduardo Martines Júnior. “O STF gasta tempo demais analisando crimes que às vezes nem deveriam ser analisados ali.” O professor, no entanto, citou mais uma dificuldade de interpretação do voto de Barroso, desta vez relacionada à conexão de inquéritos.
“Se estamos falando de um autor de crimes enquanto governador, deputado estadual e hoje é senador, por exemplo, este deve ser julgado pelo STF, conforme dita seu foro atual. Se a gente for pegar cada processo e ficar repartindo cada um para sua devida instância, a coisa não evolui.”
Ainda assim, ele apontou que tudo será um mistério até que a questão seja definida pelo STF. “Só teremos certeza quando o acórdão for publicado. Não dá para prever todos os casos, o tribunal não irá estabelecer todas as possibilidades.”
Placar
Até agora, seis ministros concordaram com a tese do ministro Luís Roberto Barroso de que o foro privilegiado deve ser limitado aos crimes praticados no exercício do mandato e em função do cargo ocupado.
O ministro Alexandre de Moraes também concorda com a restrição do foro, mas em menor extensão. Para ele, a prerrogativa deveria valer para crimes cometidos a partir da diplomação dos parlamentares, independentemente de terem relação ou não com o cargo.
O julgamento será retomado com o voto do ministro Dias Toffoli, que havia pedido vista em novembro de 2017. Toffoli deverá acompanhar o entendimento de Alexandre de Moraes, considerado mais objetivo e com um marco temporal mais delimitado do que a hipótese defendida por Luís Roberto Barroso.
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Fonte: Metrópoles.