Semana passada, eu preparei umas alegações finais nas quais suscitei, entre outras teses, a atipicidade dos atos imputados ao acusado. Isso me lembrou o “caso Bolsonaro”. Explico.
No Direito Penal há a teoria do iter criminis, que significa “caminho do crime”. Por essa teoria, o itinerário do crime tem quatro fases, a saber:
A) cogitatio ou cogitação: momento em que nasce a ideia criminosa na cabeça do agente;
B) preparação: o agente planeja o cometimento do crime e escolhe os meios a serem empregados;
C) execução: o agente pratica atos que integram a conduta descrita no tipo penal;
D) consumação: fase em que o resultado pretendido pelo agente se concretiza.
Ainda segundo essa teoria e jurisprudência, os atos preparatórios são impuníveis, salvo quando constituem crime autônomo. Ex.: o porte ilegal de arma de fogo é crime autônomo em relação ao delito de homicídio.
Pois bem. Estou convencido de que Bolsonaro idealizou e planejou um “golpe de Estado”. Disso não tenho dúvidas.
Contudo, quando percebeu a inviabilidade do “golpe”, ele desistiu de levá-lo a efeito.
Daí minha convicção – mas posso estar errado – de que, em relação aos crimes de tentativa de “abolição do Estado Democrático de Direito” e de “Golpe de Estado”, os atos por ele praticados – incluindo as reuniões com generais das Forças Armadas – ficaram na fase da preparação, pelo que são atípicos.
No tocante aos atos de depredação do patrimônio público, vislumbro que ele pode ser responsabilizado criminalmente, pois deveria – e não fez – ter aceitado o resultado das urnas e dispersado a turba. Nesse ponto, vejo a incidência da omissão penalmente relativamente, nos termos do art. 13, § 2º, “c”, do Código Penal.
Isso porque, com seu comportamento anterior (ataque às urnas eletrônicas, divulgação de fake news, recusa de aceitar a derrota nas eleições, etc.), Bolsonaro “criou o risco da ocorrência do resultado”.
Sobre o crime de organização criminosa prefiro não me manifestar e aguardar a decisão do Supremo Tribunal Federal.