Tancredo morreu antes de tomar posse

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Tancredo morreu antes de tomar posse
Vencedor no Colégio Eleitoral em 1985, mineiro escondeu doença durante a campanha. Seu vice, o maranhense José Sarney, oposicionista de última hora, assumiu Presidência

Quando o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo Neves presidente da República, em 15 de janeiro de 1985, a saúde do político mineiro já era frágil. Em maio de 1984, Tancredo mantivera em sigilo uma infecção renal. A partir de setembro, já em campanha, teve surtos de febre e fortes dores abdominais. Em 31 de dezembro de 1984, quando sua eleição estava garantida, ouviu da mulher, Risoleta, o conselho para procurar um médico.

— Preciso antes tomar posse e viabilizar a institucionalização do país — respondeu.

Não conseguiu. Na madrugada de 15 de março de 1985, data da posse, Tancredo foi levado ao Hospital de Base, em Brasília, e operado. Seu vice, o maranhense José Sarney, um oposicionista de última hora, assumiu interinamente a Presidência O laudo oficial falava em diverticulite, mas os médicos já sabiam que ele tinha um tumor. A partir dali, o Brasil acompanhou o calvário do civil que poria oficialmente fim ao regime militar. Para tranqüilizar os cidadãos, em 18 de abril, foi divulgada uma foto em que o presidente aparecia sorridente. Ali, os especialistas já admitiam que não havia mais esperanças. Três dias depois, em 21 de abril, Tancredo morreu, de septicemia (infecção generalizada), e Sarney foi efetivado no cargo no dia seguinte, cumprindo o mandato até o fim.

A vitória do político mineiro no Colégio Eleitoral, com 480 votos, coroara um processo de afirmação da democracia que tomava corpo há tempos. O esgotamento do regime miltar era visível até no fato de muitos de seus quadros civis estarem apoiando o ex-primeiro-ministro da fracassada experiência parlamentarista do governo João Goulart. Menos de um ano antes, em abril de 1984, a derrota da emenda Dante de Oliveira, que restabelecia eleições diretas para presidente, já tinha frustrado o país, que torceu pela sua aprovação, quase voto a voto, em praças públicas.

A ditadura nem de longe se parecia com a da primeira metade dos anos 70. O AI-5 era História; a censura à imprensa, coisa do passado; a tortura política tinha sido abolida; e, até mesmo, os atentados do início dos anos 80 praticados pelos “bolsões sinceros, mas radicais” — a extrema-direita militar que resistia à abertura — já tinham cessado em troca da impunidade dos culpados pelo episódio do Riocentro.

Assim, a eleição de Tancredo, candidato pela Aliança Democrática Nacional, consumava um projeto que não era só de segmentos da oposição. Em grande medida era, também, o do presidente Ernesto Geisel (que governou o país de 1974 a 1979), com a sua distensão lenta, gradual e segura, e o de seu desdobramento, a abertura política de João Figueiredo (o último general no poder, de 1979 a 1985). O mineiro era o nome ideal para personificar a transição: não podia ser acusado de conivência com a ditadura, mas era respeitado e aceito pelos militares. E sua presença era garantia contra possíveis sentimentos revanchistas, que os militares temiam.

Fonte: Acervo Globo

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