Eu extraí todos os parágrafos em que aparece a palavra “família” no “Manifesto Comunista” [de Karl Marx] e, por mais que eu tenha tentado, não encontrei nenhuma proposta de acabar com a família.
A seguir estão todos os parágrafos em que aparece a palavra “família” no “Manifesto Comunista“.
“A burguesia arrancou à relação familiar o seu comovente véu sentimental e reduziu-a a uma pura relação de dinheiro.“
“As condições de vida da velha sociedade estão aniquiladas já nas condições de vida do proletariado. O proletário está desprovido de propriedade; a sua relação com a mulher e os filhos já nada tem de comum com a relação familiar burguesa; o trabalho industrial moderno, a subjugação moderna ao capital, que é a mesma na Inglaterra e na França, na América e na Alemanha, tirou-lhe todo o carácter nacional. As leis, a moral, a religião são para ele outros tantos preconceitos burgueses, atrás dos quais se escondem outros tantos interesses burgueses.“
“Supressão da família! Até os mais radicais se indignam com este propósito infame dos comunistas.“
“Sobre que assenta a família atual, a família burguesa? Sobre o capital, sobre o proveito privado. Completamente desenvolvida, ela só existe para a burguesia; mas ela encontra o seu complemento na ausência forçada da família para os proletários e na prostituição pública.“
“A família dos burgueses elimina-se naturalmente com o eliminar deste seu complemento, e ambos desaparecem com o desaparecer do capital.“
“O palavreado burguês acerca da família e da educação, acerca da relação íntima de pais e filhos, torna-se tanto mais repugnante quanto mais, em consequência da grande indústria, todos os laços de família dos proletários são rasgados e os seus filhos transformados em simples artigos de comércio e instrumentos de trabalho.“
“Este socialismo dissecou com a maior acuidade as contradições nas relações de produção modernas. Pôs a descoberto os fingidos embelezamentos dos economistas. Demonstrou irrefutavelmente os efeitos destruidores da maquinaria e da divisão do trabalho, da concentração dos capitais e da posse fundiária, a sobreprodução, as crises, o declínio necessário dos pequenos burgueses e camponeses, a miséria do proletariado, a anarquia na produção, as desproporções gritantes na repartição da riqueza, a guerra industrial de extermínio das nações entre si, a dissolução dos velhos costumes, das velhas relações de família, das velhas nacionalidades.“
“As suas proposições positivas sobre a sociedade futura, p. ex., supressão da oposição entre cidade e campo, da família, do proveito privado, do trabalho assalariado, a proclamação da harmonia social, a transformação do Estado numa mera administração da produção — todas estas suas proposições exprimem meramente o desaparecimento da oposição de classes que só agora começa a desenvolver-se, que eles não conhecem senão na sua primeira indeterminidade sem figura.“
Como se pode ver, não há nenhuma proposta de acabar com a família, mas uma constatação de que a grande indústria destruiu os laços de família dos proletários e os seus filhos foram transformados em simples artigos de comércio e instrumentos de trabalho.
Ao contrário do que dizem os detratores de Marx, o texto denuncia a ação destruidora do capitalismo sobre a família da classe proletária.
Na verdade, embora não esteja escrito explicitamente, o que se pode deduzir do texto do “Manifesto Comunista” é uma proposta de reconstrução da família com o seu “comovente véu sentimental“.
Essa reconstrução é necessária, porque o capitalismo resultou na “ausência forçada da família para os proletários e na prostituição pública“.
Eu não consigo entender que estratégia é essa dos formadores de opinião da direita em tentar falsificar as ideias de um livro que tem apenas 23 páginas e que está disponível em todas as línguas.
A única explicação que me ocorre é que eles acreditam que a maioria das pessoas é tão idiota que jamais verificaria o texto para descobrir a falsificação.
Texto: Orfeu Maranhão Moreira Barros – Antigo Auditor Federal de Controle Externo Aposentado em Tribunal de Contas da União 1993–2015.
Nota
Escrito durante uma época de intensas transformações econômicas e sociais, o manifesto surge em meio ao avanço da Revolução Industrial e às crescentes desigualdades entre a burguesia, que controlavam os meios de produção, e o proletariado, que vivia em condições precárias. A obra também foi publicada pouco antes da eclosão das Revoluções de 1848 na Europa, movimentos que buscavam maior liberdade
Com a célebre frase “Proletários de todos os países, uni-vos!“, o texto tornou-se um marco do pensamento revolucionário e ainda inspira debates sobre economia, política.