Às 11h do dia 28 de fevereiro de 1998, se iniciava um dos capítulos mais emblemáticos da história do presídio São José, uma rebelião que duraria mais de 24h e que terminaria com um saldo de 3 mortos e outros tantos feridos.
A rebelião de 1998, é considerada uma das piores rebeliões que o Pará testemunhou, cujas consequências ecoam até os dias atuais. A rebelião destaca-se principalmente pela morte de José Augusto Viana David, conhecido pelo apelido “Ninja“, um dos personagens centrais desse episódio sombrio.
A notícia ganharia destaque não só na imprensa local, mas também tomaria proporção nacional por meio de grandes veículos de informação.
Quem era José Augusto Viana David, o Ninja?
José Augusto Viana David, conhecido pelo apelido “Ninja“, é um nome que se tornou sinônimo de audácia e astúcia no mundo do crime. Nascido em 28 de setembro de 1968, em Belém, Pará, Ninja veio de uma família com um cenário aparentemente contraditório: seu pai era um policial militar, enquanto sua mãe era uma dona de casa dedicada.
Ninja rapidamente ganhou fama como um dos ladrões de bancos mais ousados e implacáveis do país. Suas façanhas criminosas incluíam formação de quadrilha, assaltos à mão armada, latrocínio e até mesmo homicídios.
O modus operandi de Ninja era caracterizado por grandes assaltos a bancos, executados com precisão. Ele não hesitava em atacar até mesmo os locais mais protegidos e vigiados, como a sede do HSBC em Curitiba, demonstrando uma coragem e ousadia sem limites.
Em janeiro de 1995, o bando de Ninja invadiu a agência do Banco do Brasil localizada na tv. Padre Eutíquio. Um cliente e um guarda foram agredidos com coronhadas, enquanto a gerente, Silvia Lopes, se viu diante da mira de Ninja, o líder do grupo, pressionou o gatilho, assassinando a gerente em um ato de pura crueldade.
Na delegacia, em meio à investigação, o criminoso demonstrou um comportamento desdenhoso, chegando até mesmo a chamar o assassinato de “incidente de trabalho”. Apesar da gravidade do crime, Ninja nunca assumiu a autoria do crime. Anos mais tarde, ele morreria recusando-se a admitir sua culpa.
Seus ataques deixavam um rastro de destruição e morte, com pelo menos uma vítima fatal em cada investida. O episódio na agência do Banco do Brasil tornou-se mais um capítulo sombrio na história de Ninja.
28 de fevereiro de 1998
As rebeliões no sistema penitenciário muitas vezes se revelam como tentativas de fuga frustradas, levando os detentos a iniciarem motins, fazerem reféns e apresentarem uma série de exigências. Os presidiários recorrem a atos extremos na esperança de alcançar seus objetivos.
No entanto, essas tentativas raramente resultam na tão almejada fuga, mas sim em situações caóticas que colocam em risco a segurança de todos os envolvidos, sejam eles presos, funcionários penitenciários ou mesmo pessoas que possam ser feitas reféns involuntariamente. Em 1998 foi a vez de Ninja, por possuir uma pena grande em decorrência de crimes como latrocínio e assaltos a banco. Seu único intuito era fugir.
De acordo Giane Salzer, a então diretora do presídio, ela seria o alvo dos detentos, a intenção de Ninja seria fazê-la de refém para fugir, contudo, ela não estava na unidade prisional no dia e mesmo assim os detentos deflagraram o motim. Durante a rebelião, foram tomados como reféns, três agentes prisionais, um agente administrativo e o casal da Pastoral Carcerária (PC), totalizando 06 pessoas.
Não demorou para que policiais fossem acionados para conter a rebelião e cercassem o presídio São José.
Na madrugada de domingo o clima ficou tenso quando um dos reféns foi posto no alto do prédio e recebeu ameaças de morte. Começou uma violenta troca de tiros. O dia era de visitas, mas não entrava ninguém, parentes de presos se desesperaram e várias pessoas se aglomeram ao redor do prédio, curiosos com a situação. Os rebelados ameaçaram jogar um dos reféns do alto do prédio, enquanto outro foi pendurado de cabeça para baixo por aproximadamente trinta minutos.
O tempo passava e as negociações aumentavam, a polícia não pretendia ceder, as exigências que consistiam em armas, coletes à prova de balas e um carro blindado para a fuga.
De acordo com Salzer, que chegou a conversar com Ninja através do rádio, o criminoso teria dito que não iria recuar ou se render, que se quisessem os reféns vivos seria melhor atender suas exigências
O fim da rebelião, que já ultrapassava 24 horas, parecia estar finalmente próximo. No início da tarde de domingo, novos disparos vindos do telhado. em seguida os amotinados informam que o líder ninja está morto, seu corpo desce enrolado a uma corda.
O desfecho trágico
A rebelião alcançou novos níveis de brutalidade quando detentos espancaram um colega de cela, que se jogou de uma altura aproximadamente 15 metros de altura. O ato revoltou até mesmo policiais, iniciando uma nova troca de tiros. Em meio ao caos, outro detento foi jogado do alto do prédio. Eplaugênio Duarte, o Carequinha, teve morte instantânea.
Finalmente às 14h do domingo os detentos resolveram se render em encerrar a rebelião no presídio São José, porém, esse capítulo dificilmente seria esquecido ou apagado da memória coletiva paraense.
As circunstâncias que levaram à morte de Ninja permanecem envoltas em mistério e especulação, alimentando uma série de versões conflitantes sobre o incidente. Algumas versões sugerem que a rebelião foi desencadeada por disputas internas de poder entre os próprios detentos, enquanto outros apontam para uma discussão aparentemente banal relacionada à distribuição de alimentos.
Uma das versões mais difundidas, seria a de que Ninja teria subido ao telhado do presídio, onde se envolveu em uma acalorada discussão com outro detento. Nesse momento tenso, o conflito teria escalado rapidamente, resultando em disparos fatais que atingiram o rosto de Ninja, o matando instantaneamente.
Certamente, a imagem do corpo de Ninja pendurado em uma corda feita com lençóis, é uma das cenas mais marcantes da rebelião de 1998. Até hoje, as múltiplas narrativas que cercam esse evento trágico servem como um lembrete sombrio das tensões latentes e das complexidades que permeiam o sistema carcerário, instigando um clamor por mudanças e reformas profundas.